a república madeirense e o governo regional do continente, por ricardo araújo pereira


Que Portugal estava confrontado com o Cobrador do Fraque já se sabia; que tenha ainda de suportar o Cobrador Fantasiado de Shaka-Zulu acrescenta enxovalho ao que já era embaraçoso.

Este ano, excecionalmente, Alberto João Jardim começou o ano político a pedir dinheiro ao governo. Alguma vez tinha de ser. A crise toca a todos, e a prova é que até um homem conhecido por se contentar com o orçamento de que costuma dispor - que, além do mais, é acanhado - dá por si com falta de liquidez. Quer isto dizer que Alberto João Jardim está endividado, como boa parte dos portugueses? Não. Quer apenas dizer que Alberto João Jardim está endividado. Mas endividado à sua maneira, com uma dignidade e um sentido de Estado que as dívidas dos seus concidadãos não possuem.

Talvez os leitores incapazes de distinguir as dívidas normais das dívidas patrióticas não compreendam a diferença sem uma explicação adicional. Felizmente, Alberto João Jardim forneceu-a. Disse que aumentou a dívida da Madeira para se defender do "ataque financeiro"

constituído pela lei das finanças regionais, aprovada pelo governo anterior. "Com este rombo nas finanças da Madeira, eu só tinha duas hipóteses: ou fazia como no boxe, jogava a toalha ao chão e desistia "(...) ou então enfrentava-os como enfrentei e aumentei a dívida da Madeira." E acrescentou que optou pela "derrapagem financeira" para "resistir à agressão socialista (...) e agora poder negociar com o Governo que é liderado pelo PSD". A explicação é cristalina, mas talvez fique ainda um pouco mais clara se vertermos algumas expressões para um português mais simples. Quando diz que, perante a lei das finanças regionais, podia ter feito como no boxe e lançado a toalha, Jardim quer dizer que podia ter optado por cumprir a lei, mas isso seria uma mariquice equiparável a desistir de uma boa zaragata; quando diz que enfrentou o governo anterior e vai negociar com o atual, quer dizer que usou o nosso dinheiro indevidamente e agora chegou a altura de pagarmos a conta. Que Portugal estava confrontado com o Cobrador do Fraque já se sabia; que tenha ainda de suportar o Cobrador Fantasiado de Shaka-Zulu acrescenta enxovalho ao que já era embaraçoso.

No entanto, trata-se de um embaraço merecido. O povo português endividou-se por inconsciência, irresponsabilidade ou laxismo; Alberto João optou por contrair dívidas porque é corajoso, rebelde e arrojado.

É apenas justo que quem se endivida da maneira errada pague também as dívidas de quem se endivida da maneira certa. Eu próprio tenho algumas dívidas, mas são todas da responsabilidade do governo anterior. Para enfrentar José Sócrates, tive a presença de espírito de me endividar.

Creio que ele já aprendeu a lição. Assim que o povo português acabar de pagar as dívidas de Alberto João Jardim, faça o favor de pagar as minhas.

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